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Monday, March 28, 2005

15/XV - O MÁGICO QUE NÃO ERA MÁGICO

*
Ilustração Original, 1900.

 
Imagem da Internet



 
 
Dorothy toca a sineta. O Guardião abre a grande porta, surpreso.
- O quê?!... Estão de regresso?
Dorothy, rindo:
- O que há de errado?
- Pensei que tivessem ido às Terras da Bruxa Malvada do Oeste.
- Acabamos de voltar de lá.
- Uai, como escaparam da Bruxa?
- Ela derreteu-se – esclarece o homem de palha.
- Derreteu-se?
- Como num passe de mágica, a malvada evaporou-se, entende?
Sumiu no ar.  
- Como assim?
- Coisa de Dorothy! – adianta o Leão.
- Santo Deus! – exclama o guarda, já fazendo reverência à garota. - Ótima notícia, garota.
- Para você ver como são as coisas! – aplaude o Espantalho todo sorridente.
 – Podem me contar isso direito?
- Isso é história para outra hora – interfere a garota. - Primeiro, nos leva ao Grande Mágico.
- Garota, preciso saber mais sobre esse acontecimento fabuloso – insiste o Guardião, verde de curiosidade.
- Depois.
- Mas é verdade, a Bruxa sumiu no ar mesmo, escafedeu-se – confirma o Espantalho.
- Custo acreditar!
Boquiaberto com a façanha, o homenzinho de barba verde imediatamente coloca os óculos verdes em cada um, tal como havia feito anteriormente, prometendo levá-los ao Grande Mágico.
Ao chegarem ao Palácio, de novo, a bonita jovem verde conduz os forasteiros aos seus respectivos quartos para descansar e aguardar o dia em que o Grande Oz pudesse recebê-los.
Oz, ao saber que os viajantes estavam de regresso por terem eliminado a Bruxa Maligna, não fez nenhum comentário, muito menos marcou o dia da entrevista. Dorothy e os companheiros ficam intrigados com a indiferença do Mágico. Três dias mais tarde, cansados e aborrecidos de tanto esperar, o Espantalho perde a paciência e manda um recado curto e grosso a Oz: caso não fossem atendidos, ele chamaria os Macacos Alados para obrigá-lo a cumprir as promessas.
Quando o Mágico recebe a mensagem leva um grande susto. Diante da ameaça, imediatamente, manda dizer a eles que, às nove horas da manhã seguinte, iniciaria o encontro com todos os visitantes.
Mal amanhece o dia, Dorothy e os amigos já estavam acordados e animados para o encontro com o Grande Mágico.  Nove em ponto o soldado de barba verde foi buscá-los e, poucos minutos mais tarde, entram todos no Salão do Trono, inclusive Totó. Cada um mais curioso do que o outro para ver como o Mágico se apresentaria. Para surpresa geral não havia ninguém no salão, mas do teto logo desceu uma voz imponente:
- Sou Oz, o Grande e Terrível!... Que querem de mim?
Dorothy começa a olhar para todos os lados, abismada.
- Onde está você? – pergunta.
- Em toda parte – respondeu a voz. – Sou invisível para os olhos dos mortais comuns. Agora, irei sentar em meu trono para que possam conversar comigo.
- Assim é melhor.  Viemos pedir que cumpra suas promessas – adianta Dorothy.
- Que promessas?
- Mandar-me de volta para o Kansas, assim que a Bruxa Malvada do Oeste fosse destruída.
- A mim, prometeu um cérebro – lembra o Espantalho.
- A mim, um coração – reclama o Homem de Lata.
- E a mim, muita coragem – urra o Leão Medroso.
Oz altera a voz:
- Estão certos de que a Bruxa foi realmente destruída?
- Claro que sim. Eu mesma dissolvi a infeliz com um balde de água – esclarece a garota.
- Boa notícia que me traz. Parabéns. Mas tenho que pensar sobre o assunto. Voltem amanhã.
- Mais tempo? Teve tempo de sobra, meu caro! - bronqueia o Leão.
- Só mais um dia. Eu prometo.
- Não. Não. Você já teve muito tempo – repete o Lenhador, inquieto.
O Espantalho dá um passo à frente:
- Tudo bem!... Só mais um dia, caso contrário, os Macacos Alados poderão nos ajudar a resolver essa questão, certo? Não queremos esperar mais.
- Podem confiar.
O Leão Medroso, só para dar um susto ao Mágico, solta um rugido tão alto e longo, que Totó dá um pulo para trás e derruba o biombo num canto da Sala, fazendo um barulho danado. Todos olham para trás e ficam espantados ao ver que o tapume escondia um velhinho calvo, rosto enrugado, barba e bigodes por fazer, metido num grosso capote de lã e, calçando sapatos de lona verde, tão espantado quanto eles.
O Homem de Lata levanta o machado, pronto para atacar:
- Quem é o senhor?
- Sou Oz, o Grande e Terrível – responde o homenzinho com um sorriso amarelo.
- Não pode ser! – murmura Dorothy, mal acreditando no que via.
– Por favor, não me machuquem. Farei o que quiserem.
Dorothy, desapontada:
- Pensei que Oz fosse uma cabeça enorme!
- E eu, uma linda Princesa! – entristece o Espantalho.
- Ainda bem que não é uma fera! - resmunga mais aliviado o Homem de Lata.
- E eu acreditei que Oz era uma Bola de Fogo! – rosna o Leão.
O velhinho recua um pouco, encafifado. Ao se ver em tamanha enrascada, seus olhos ficaram acesos como duas brasas, um sorriso amargo bailou nos lábios e o desejo de sumir correu-lhe como um raio pelo corpo todo. Mesmo assim, furioso dentro de si, porém sorrindo, admite com humildade:
- Enganei a todos. Eu sinto muito, perdoem-me.
- Então não é o grande mágico? – inquire Dorothy.
- Essa é a grande pergunta.
- Vamos, fala.
- Pssssiu! Pssssiu! Fale baixo, menina, ou estarei arruinado. Aqui todos acreditam que sou o Grande Mágico.
Um lobo ruge dentro do espantalho:
- É ou não é?
- Bem!... Aprendi alguns truques – confessa o velho, estalando a língua de nervoso.
- Um impostor, fazendo todos nós de bobo! – vocifera o Lenhador, cuspindo óleo de raiva e o machado suspenso ar.
E mais nervoso ainda, aproxima-se de Oz, condenando:
– O que está feito está feito, já era. Agora, acabou a moleza, velho idiota! Aqui se faz aqui se paga.
- Calma, calma – pede apavorado o impostor.
- Só preciso de um mínimo de raiva para entrar no clima e acabar com você, viu?
Oz retrocede mais um pouco e torna a estalar a língua:
- Não sou mais do que um homem comum. Podemos conversar, o diálogo é o melhor remédio para se chegar a um acordo, certo?
Dorothy, cada vez mais confusa, fuzila Oz com um olhar inquisidor.
- Como me apareceu sob a forma de cabeça?
- Já disse, conheço os truques - responde Oz, com o olhar cada vez mais inquieto.
- Ora essa, então nos fez de bobos? – pergunta irritado o Espantalho.
- Posso explicar tudo, tin-tim por tin-tim.
- Queremos ver, mágico de uma figa. Caso contrário... – intimida o Leão.
- Sigam-me, por favor.
Oz, mesmo nervoso de tanto medo, ergue a cabeça e conduz o grupo a um quarto, atrás da Sala do Trono. A primeira coisa que eles viram foi a imensa cabeça feita de papelão, abandonada num canto.
- A cabeça ficava pendurada no teto. Atrás do biombo eu manipulava os fios para fazer mover os olhos e a boca – explica o homenzinho.
- E a voz?
- Sou ventríloquo. Jogo o som da minha voz para onde quiser.
- Trem danado! – admira o Espantalho.
O falso Mágico mostra-lhes o vestido e a máscara que usou para se transformar numa linda princesa. No outro canto do quartinho, viram que a fera horrível não passava de um monte de peles, costuradas umas às outras numa estrutura de arame. A bola de fogo, nada mais era do que uma grande bola de algodão, embebida em óleo de mamona, queimando intensamente.
Dorothy e os amigos, em silêncio, ficam pasmos diante daquele inteligente aparato feito para enganar as pessoas.
- Francamente, deveria se envergonhar de ser um vigarista - recrimina o Leão.
- Ah, sim. Tenho vergonha, é claro. Mas era a única coisa que poderia fazer. Sentem-se, por favor. Escutem a minha história.
Interessados, cada um se acomoda nos tamboretes espalhados pela sala. De pé, Oz começa a contar:
- Nasci na cidade de Omaha, localizada no estado americano do Nebraska. Muito longe daqui, mas o Condado de Douglas não é tão longe assim do Kansas.
Dorothy até ensaia um sorriso. O velho continua:
- Comecei a ganhar a vida como ventríloquo, apresentando espetáculos com bonecos. Com o tempo, aprendi a fazer algumas mágicas e passei a trabalhar num circo de picadeiro, tirando coelhos e pombos da cartola. Nas horas de folga, eu era balonista.
- Como assim?...
- Isso mesmo, menina: balonista. De cima de um balão, anunciava o espetáculo na cidade.
- Ah, sim! – entende Dorothy.
- Certo dia, as cordas que prendiam o balão ao solo arrebentaram e, sem poder baixar, uma corrente de ar me levou para muito longe. Durante um dia e uma noite viajei sem destino, até que na manhã seguinte pude ver que a aeronave voava sobre uma região muito bonita. Por fim, ele pousou numa terra ensolarada, onde fui recebido por um povo de sorriso largo que, me vendo descer das nuvens, imaginou que fosse um grande mágico.
- Nossa!... E aí? – interrompe Dorothy outra vez.
- Não desmenti, é claro. Foi até bom. Uma vez no lugar, otimista por natureza, aquietei-me. Pude me persuadir de que não tinha nada a fazer, a não ser jogar a semente do entusiasmo ao solo daquela rica região, torcendo para germinar, crescer, dar frutos e acumular fortuna, até porque ninguém vence sozinho, não é mesmo? Enfim, a relação de anos com aquela gente estava só no começo.
Depois de um breve suspiro, Oz continua:
- A partir daí, essa gente começou a me adorar como se fosse um ser especial, cheio de poderes mágicos. Um rei. Logo, sob o meu comando, construíram a Cidade das Esmeraldas e esse fabuloso palácio, onde passei a morar. Sendo o verde a cor da esperança, e minha tonalidade predileta, decretei que todos os habitantes usassem óculos de lentes verdes, para que as coisas lhes parecessem sempre verdes.
- Então, nem tudo aqui é verde?
- Bem, menina!... Isso é outro truque: quem usa óculos de lentes verdes, tudo que vê lhe parece verde, não?
- Meu Deus!... Você é mesmo um senhor farsante!...
- Sou bom para o povo. Sou compreensível, todos aqui gostam muito de mim.
- E por que não aparece para eles?
- Faz parte do jogo. Pensei manter mistério para favorecer a imagem fantástica de Oz. Temia as Bruxas, principalmente as do Oeste e do Leste. Elas poderiam me destruir a qualquer momento. Felizmente você acabou com as duas.
- Então, cumpra a promessa e me faça voltar para casa.
O Mágico revira os olhos:
- Também estou preocupado. Agora que vocês sabem que não sou mágico tão poderoso, não sei como cumprir minhas promessas.
- Ah! Isso é que vamos ver, seu cabeça de bagre!  – vocifera o Homem de Lata com o machado nas mãos.
Oz treme dos pés à cabeça. Sorri, sem vontade e tenta se defender, dizendo:
- Oh, não, minha gente!... Apesar de tudo, sou um homem bom.
- Quer dizer que não me dará um cérebro? - lamenta o Espantalho.
- Para quê? Adquirimos conhecimentos com a experiência da vida – afirma Oz, ensaiando um sorriso maroto.
- Sem cérebro, nunca serei feliz.
Após pensar um pouco, o falso mágico olha para o boneco com ar de quem estava muito comovido.
- Tudo bem, amigo. Volte amanhã que rechearei sua cabeça com um cérebro. Mas, como usá-lo, terá que descobrir sozinho.
- Melhor assim.
- E a minha coragem?
- Meu bom Leão, eu estou seguro que lhe sobra coragem. Falta-lhe apenas confiança em si mesmo. Não há criatura nesse mundo que não sinta temor diante do perigo, pode crer. O medo faz parte da vida de quem teme o risco.
- Pois fique sabendo que nunca serei feliz se não me arranjar bastante coragem.
- Muito bem, fique tranquilo que amanhã cuidarei do seu caso – repete Oz.
- E o meu coração?
- Bobagens, meu caro Homem de Lata! Coração, no mundo de hoje, essa peça só traz infelicidade.
- Mesmo assim, eu quero o coração prometido. Desculpe-me, assunto encerrado.
- Tudo bem. Amanhã vou arranjar-lhe um coração de verdade.
O Homem de Lata balança a cabeça, concordando. Dorothy, mais do que depressa:
- E como voltarei ao Kansas?
- Pensaremos sobre isso amanhã – assegura o homenzinho.
- Mas...
- Sossega, minha filha. Vamos estudar e descobrir a melhor maneira de atravessar o deserto. Amanhã, garanto, todos ficarão satisfeitos com meu trabalho. Mas, por favor, não contem a ninguém que sou um impostor.
Todos balançaram a cabeça, concordando. Retiram para seus quartos, acreditando que Oz não era tão mau assim, iria achar meios de satisfazer cada um dos viajantes.

 

* FBN© - 2013 –  O Mágico que não era Mágico  – Cap  15 de O MÁGICO DE OZ – Adaptação livre do original, editado no ano de 1900,  por: Welington Almeida Pinto - Categoria: Prosa Infanto-Juvenil – Texto original em português - IIustr.: Imagens da Internet  Link: http://omagicodeoz.blogspot.com.br/2005/03/o-mgico-que-no-era-mgico.html

 

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